A Dor do Devorador

A dor do Devorador.

Existem muitos céus por baixo deste céu noturno, ainda mais fortuitos e assombrosos do que dos céus diurnos. Pois, nestes céus vivem as criaturas do dia e da noite, já nos iluminados apenas os brilhantes se encaram. Não sei lhe dizer ao certo quem sou, se o que fui é real, ou se o que conto tem sentido ou razão, mas apenas quero contar, revelar o que meu coração nesse momento guarda, uma mistura inócua de culpa e prazer. 

Minha existência é um dos mais ternos enigmas, aposto que me consideraria uma fantasia, um silvo do passado, apenas uma ideia. De certa forma sou, da forma que me escrevo e que me imagino, tanto que posso mudar em um salto. O peso de minhas memórias são tão reais quanto os desejos sórdidos em meu peito, podem parar de existir em qualquer lampejo, e logo serei outras pessoas.

 Mas, uma coisa é certa, este outro terá o meu mesmo alimento, o sangue que corre por seu pescoço e é desperdiçado por sua fala, o calor de suas veias que atiça minhas entranhas. Pois, sou como o fogo, o eterno fogo que queima, e você criatura, é o meu alimento. Porém, se desesperar seria estupidez, pois como digo: somos os seres do 3, o Criador, a Criatura e o Devorador.
Não posso ser tocado, a não ser por outros dos meus mesmos. Tenho em mim os desejos, tenho em mim a eterna diversão. Pois, nunca me verá realmente triste, nunca me verá realmente cansado, e nunca me verá farto, mas pode me ver colérico, na cólera da fome e o divertimento no terror. Lhe peço, não queira ver essa face, pois teu sangue escorrerá enquanto eu falo, e tua vida se esvairá para minha diversão, e depois que estiver em seu leito não terei arrependimentos, pois não serei mais este eu que vos fala. Serei o próprio alento do medo.

É do Devorador que vocês têm medo, e não lhes tiro o motivo. Somos a ânsia, a ganância e o mais vivido poder. Somos a vida que leva a morte, o breu que carrega a luz individual. Temos nossas tochas acesas, mas fazemos de vocês nosso alimento. Sua vida queima em nossas veias, ironicamente é para isso que servem muito de vocês. Assim como o gado no cerco muitos vivem, até alguns de nós. 

Regozijo-me nessa possibilidade, hora ou outro encontro um dos meus, sofrendo e correndo como um dos seus. É tão triste, mas me vejo tão alegre, pois imagino como ele se sentirá quando perceber ser um Devorador, pois ele há de perceber, pois, não somos tolos, nenhum de nós é. 

E nem você, que está lendo, mas será se não perceber um de nós no escuro. Mas o que poderá fazer, não é? Oferecer seu sangue de bom grado? Essa seria uma escolha divertida, mas pode experimentar correr, claro que pode. Espero que seja bem rápido, adoramos testar o quão melhores ficamos depois da última alimentação.

Ocorre muitos de nos sentirmos culpados. Sentem-se tristes e desesperados com suas condições, com seus objetivos. É fácil de entender, eu também senti. Advém que mesmo nestes momentos, existe uma gargalhada em nosso interior, existe um prazer incompreensível na culpa e no desastre.

 Mas não se exalte, mortal, o fato de você ser desajustado não lhe classifica como um Devorador. Não é um dos meus os que não reconhece a bondade, aqueles que não possuem glória são resíduos, vá atrás de um terapeuta, reles estúpido. Tua vitalidade apenas envenenaria um iniciante dos meus.

Os iniciantes possuem 4 escolhas quando encontram consigo: rejeitar quem são, dizendo a si mesmos que deve haver algum engano, ou apenas está imaginando; adentrar no caminho e sentir culpa por estar fazendo isso com seus semelhantes, o sangue é delicioso, e o poder... ah o poder... Luminoso, mas a culpa que fica é amarga e escura; reconhecer quem é, e devorar sem medo ou culpa, chegando a tornar-se desenfreado e... Aborrecedor; E reconhecer quem é, porque é assim, e devorar na medida exata, no tempo exato, e nunca, nunca perder uma oportunidade fortuita, isto seria um pecado, afinal: ‘Que Devorador rejeita o prazer saudável?’ Veja bem, querido ou querida leitora: saudável. A imortalidade não é mantida por sanduíches ou Nutella. Ou por prostitutas gratuitas, ou pagas.

Acontece, que cada um de nós passamos pelas 4 fases iniciais, alguns tentam fugir e correr, mas alguma hora surta e devoram tudo ao redor. E isso é perigoso, até para nós. Embora saibamos punir os nossos descontrolados. 

Também podemos ‘criar’ devoradores, claro que sim, sempre é bom ter um companheiro de caça, o problema é que vocês humanos são duvidosos. Muito duvidosos. Alguns ficam fascinados com o poder, e perdem a culpa tão rápido que é de se espantar, muitos dos ‘transformados’ beiram a loucura. E esses são os que vocês caçam. Claro que sim, acham mesmo que um Devorador seria devorado? Que ingenuidade!  É quase tão engraçado quanto o mito do imortal sofredor!

- Óh minha amada... Estou a tanto sozinho em minha longa vida solitária...

- E logo estará de novo, pois vivo tão pouco...

- Desejas a imortalidade? Eu posso lhe dar e poderemos correr pelos pastos verdes (e devorar os pastores), e ter piquenique no parque central (observando uma futura vitima pedestre). Por toda eternidade, felizes (pelo sangue dos mortais).

- Não, eu não desejo sua imortalidade, mas não é porque eu não o ame. Amo muito, tanto que amarei na próxima vida. Mas terei que recusar, sou humana, e humana continuarei. Me procure na outra vida... Quando está acabar.

- Assim farei!!!

Um Imortal solitário? Quem em sã consciência iria caminhar pela imortalidade se ainda sente solidão? ; procurar em outra vida? Me poupe, as pessoas pensam que um Devorador é tão desocupado? Nós temos objetivos, temos trabalhos, temos nossa missão, assim como todos da criação, e você quer que eu ti procure? ;Tá... Tudo bem, é uma lembrança antiga, já aconteceu algo assim comigo, admito. Quanto a parte do solitário, eu estava apaixonado, não tenho culpa. E eu até ponderei se iria mesmo atrás dela, mas deixei de lado. Eu ofereci a imortalidade, para uma mortal sentimentalmente instável. Você já pensou o que uma de vocês instável faria se estivesse com raiva de alguém e carregasse o poder de devorar essa pessoa? Pelo Criador, isso seria assustador. Mas agora sou outra pessoa, já passou... Espero... Um dos seus dons, mortais, é o fascínio, a vida que pousa em cada um de vocês. E isso nos encanta tanto quanto o seu sangue corrente, da boca ao estômago.

Um dos maiores erros de vocês foram acreditar que o ser humano não possui um predador natural. Acontece não somos tão estúpidos a ponto de prendermos nossas presas em cativeiros, sempre apreciamos a caçada. O cheiro do sangue no ar. Mas obviamente do jeito que as coisas estavam indo, a tendência era nós também ficarmos cômodos, mas sabíamos de suas tendências a revoltas. 

Afinal, somos bons observadores, um dos dons que desenvolvemos. E resolvemos ajuda-los a criar uma sociedade, um lugar supostamente tranquilo, isolado dos animais perigosos e seguro. Com limites reconhecidos a olho nu. Regras do que você pode fazer e para até onde vocês podem ir. 

Claro, não se pode evitar intrigas entres os habitantes da sociedade, batalhas, lutas que levam à morte, etc. De qualquer forma, isso não lhe lembra bastante um cercado? As vacas também estão supostamente seguras dos outros predadores... E existem as leis e vigilância, graciosamente crescentes, que os impede de fugir.

 Criamos um ambiente perfeito para os nossos, um Devorador nunca sentirá tanta fome a ponto de gritar, se estiver disposto a se alimentar ao menos de tempos em tempos. Se um dos meus surge entre os mortais, quando ele percebe o que realmente é, precisará apenas olhar para os dois lados, sempre estará cercado de alimento, e irá se desenvolver até nos encontrar, até tomar seu lugar como um Devorador, até sua dor se transformar em alegria, e sua felicidade ser a própria existência.

Não se sintam mal, sério, não quero me esbanjar, ou mostrar o quão superiores nós somos, ou o quanto vocês são manipulados por vocês mesmos e pelos meus mesmos. Mas, o motivo desse escrito é para você, meu querido e adorado iniciante... Você não está sozinho, nunca esteve. 

Sei ser um pensamento recorrente, sei que talvez nem tenha despertado para a sua natureza, mas saiba... O momento chegará, e nós estaremos lá para dar as graças para o Devorador que você é. E se chegou até aqui, talvez você seja um dos nossos, ou só um mortal curioso, e entretido. Isso não importa muito. Mas, mantenha silencio, amigo, pois o Devorador não existe...

Autor: Luan Almeida

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